A ENTREVISTA - PARTE II
Uma mulher de terninho azul entrou na sala de reuniões e começou a recitar:
- Ana Luiza, Ana Paula, Antônio, Beatriz, Bruno Alvarez, Bruno Trento, Caio, Camila, Diego, Durval, Eric…
Nesse momento eu não consegui ouvir mais nada. Ela tinha acabado de chamar meu nome. Não acreditava que depois de errar o local da entrevista, chegar atrasado no local certo e participar da entrevista seguindo todas as regras, a mulher estava chamando meu nome. Mas, calma, qual era o motivo dela ter chamado meu nome?
Algumas pessoas começaram a se levantar. O sentados pareciam tristes. Comecei a olhar a cara de todos e tentar lembrar o nome de alguém para descobrir se eu era do grupo dos sentados ou do que estavam seguindo a mulher de terninho.
- Camila!- gritei e me escondi atrás de uma pessoa. Vi uma garota que seguia a mulher procurando quem a havia chamado. Desse momento até os próximos um minuto e vinte e seis segundos eu não me lembro de nada, apenas sei que estava sentado em uma mesa com mais outras quatro pessoas. Camila não era uma delas.
- Parabéns, disse a mulher do terninho, vocês foram aprovados para a fase de dinâmicas de grupo. Primeiramente, gostaria que vocês se apresentassem aqui na frente.
Regra número um: Seja um dos três primeiros ou três últimos. Entre esses, ninguém vai se lembrar de nada.
Consegui ser o segundo.
- Oi, meu nome é Eric, tenho 19 anos, estou cursando Publicidade que é a área que mais me identifico e… - Continuei me exaltando por mais quarenta e nove segundos. Contei minhas experiências de estágio e os parentes que sempre ajudei quando precisavam de um publicitário, incluindo um tio que aumentou em 10% o número de clientes depois de uma postagem que fiz no facebook da empresa dele.
- Quem é o próximo?
Bruno Alvarez. Loiro, olhos azuis, quase dois metros de altura, usando um terno que parecia ter sido esculpido no corpo dele. Ele parou na frente da sala, se ajeitou e abriu um grande sorriso branco antes de começar:
- Bom dia à todos. Meu nome é Bruno e tenho 21 anos. Sou do Rio Grande do Sul. Iniciei o curso de Publicidade na Universidade Federal do meu estado, mas no segundo ano consegui uma bolsa de estudos para concluir meu curso em Harvard e jogar pelo time de basquete da universidade. Lá pude participar de campeonatos nacionais, pois sou jogador de alta performance. Abri um restaurante em Nova Iorque com um amigo e conseguimos expandir para dez filiais pelos Estados Unidos, mas no último ano resolvi voltar para o Brasil depois de vender minha parte da empresa e hoje estou aqui participando deste processo seletivo.
…
Depois disso foi difícil prestar atenção em alguma coisa. O segundo golpe foi o vídeo “motivacional” dos estagiários do ano anterior. Mostrou a estagiária de Marketing (minha área). Estudante de Engenharia. Engenharia? Área de Marketing? Mas…
- Bom, a primeira atividade é simples, explicou a mulher de terninho, vocês, nos grupos que estão agora irão criar um produto.
Isso me animou um pouco, até ela continuar:
- Esse produto deverá ser pensado levando-se em consideração as matérias primas que causam menos impacto negativo no meio ambiente e na sociedade dos locais que eu determinarei.
Ela apontou para o meu grupo.
- Vocês serão da Guatemala.- Algumas pessoas do meu grupo comemoraram. Eu só pensei: “Como alguém fica feliz de ter tirado Guatemala? Ele estudou tudo sobre a Guatemala e teve sorte? Ou será que todo mundo sabe tudo sobre a Guatemala, menos eu?”
No fim das contas, minha contribuição para o grupo foi emprestar meu apontador para a menina que estava anotando todas as ótimas ideias do grupo.
Nesse momento eu só queria ir logo para o coffee break antes da apresentação. Até que a menina que estava anotando disse:
- Tive uma ideia! Vamos apresentar o nosso produto em castelhano!
TODOS ACHARAM A IDEIA ÓTIMA.
Eu? Eu aproveitei a deixa, disse que precisava ir no banheiro, peguei minha mochila, roubei três croissants de presunto e queijo da ante-sala e fui embora.
Talvez não fosse para ser. Talvez meu destino fosse outro. Mas uma coisa eu tinha certeza: Eu não queria trabalhar num lugar onde as pessoas sabiam tudo sobre a Guatemala. Nada contra o país, mas né?
mais uma vez o autor arrasou em seu conto, tratando do cotidiano e de uma forma muito natural e intimista, quantas pessoas assim como Eric ja não agiram assim?
ResponderExcluirhttp://felicidadeemlivros.blogspot.com.br/
rsrsrs Impossível ler um conto assim e não terminar olhando para a tela sem saber o que escrever!
ResponderExcluirRoteiro de muitos de nós, coisas que já passamos ou no mínimo, conhecemos alguém que já passou por isso.
E no mais?
Quem conhece a Guatemala?^
Adorei.
Beijo
Felipe,que conto realista,fiquei em determinado momento com pena do Eric.Mas,no cotidiano dá vida real isso é o que mais acontece.Algumas pessoas sonham alto,querem algo que ainda não estão preparadas,e muitos desistem no caminho.Um abraço.
ResponderExcluirAquele momento que a gente se sente perdido por não saber nem do que estão falando e nem como sabem disso! Haha, achei engraçado. Mas caramba, o pessoal mudando até a língua pra apresentar? Meu Deus, nem exageraram! Ou talvez só seja o caso de mostrar que para algumas coisas a gente nunca está completamente preparado mesmo.
ResponderExcluirBom conto =)
Olá Felipe,
ResponderExcluirMais um conto muito bem escrito que mostra a realidade de muitos, a vida não é fácil e temos que ralar demais....abraço.
http://devoradordeletras.blogspot.com.br/
Oi, Felipe!
ResponderExcluirDepois de participar da entrevista errada você ainda consegue ficar em um grupo fã da Guatemala!! Kkk
Beijoss
Felipe!
ResponderExcluirkkkkkkkkkkkkk
Me acabei de rir novamente.
kkkkkkkkkkk
As entrevistas são bem assim mesmo e o pior é que não sabemos se vamos ficar ou não e tudo nos amedronta, inclusive a Guatemala...kkkkkkkkk
“Quanto mais nos elevamos, menores parecemos aos olhos daqueles que não sabem voar.” (Friedrich Nietzsche)
cheirinhos
Rudy
http://rudynalva-alegriadevivereamaroquebom.blogspot.com.br/
TOP Comentarista de FEVEREIRO, livros + KIT DE MATERIAL ESCOLAR e 3 ganhadores, participem!
Dei uma corridinha lá na primeira parte, que eu não havia lido ainda, para poder comentar aqui. rs
ResponderExcluirMe lembro da minha primeira dinâmica em grupo. Não era exatamente na área de marketing, mas precisávamos vender um produto e o pessoal do meu grupo decidiu criar uma "pílula do cabelo liso". Quase chorei. De vergonha. De raiva. De indignação. De "meudeusdocéuoqueutôfazendoaqui".
Nem tanto ao céu, nem tanto ao chão, né? haha
Nesse caso, melhor deixar a Guatemala pra lá, mesmo.
Abraços solidários.