Tô Pensando em Contos... O Nome do Amor



O NOME DO AMOR




     Sentada no banco da praça, termino de ler a última página de Orgulho e Preconceito de Jane Austen, talvez pela sexta ou sétima vez, e, como sempre, sinto um misto da felicidade do amor  de Liz Bennet e Mr. Darcy, e o vazio da minha própria solidão.

     É esdrúxulo  sentir o que sinto. Sinto falta do elástico que me prende o cabelo, do cheiro de um perfume masculino barato, do gosto do cigarro na sua boca. Talvez para amenizar o vácuo que eu mesma criei, acendo o cigarro e dou uma longa tragada, soltando um sopro de fumaça quase sonhadora. 

     Então, ao longe, eu o vejo.

     Aquele que me ensinou o amor físico, que me ensinou o que é precisar de alguém tão desesperadamente, aquele escondido na minha mente, que não se revela para o mundo e por isso temo nomear.

     Ele está logo à minha frente, segura uma garotinha assustada pela mão. Lembro-me de quando eu também segurava a sua mão, nesta mesma praça, anos atrás.  Lembro-me de quando me levou para a sua casa. Lembro-me que senti medo.  Mas, hoje, o que mais me lembro é da sua gentileza ao me ensinar a obedecê-lo, de como ele me dava tudo o que eu precisava. 

     O homem sem nome está logo ali, e eu sinto tanta saudade! Tenho vontade de falar com ele, dizer que quero voltar a ser o que éramos quero estar no lugar daquela garotinha. Mas me disseram que ele me fez mal. Sou eu quem foi embora, e isso já faz tantos anos! Já sou crescida, sou mulher e saio sozinha de casa. Ele não me aceitaria mais.

     Jane Austen volta à minha mente, ela me ensina que mulheres podem ser fortes, não precisam de um homem para protegê-las.  Mas se é exatamente disso que mais sinto falta! Sinto falta dele cuidando de mim, me alimentando naquele quarto escuro e sem janelas, me tocando e me ensinando em silêncio. 

     Vou falar com ele.

     Mas onde ele está?

     Está saindo do parque, olhe!

     A garotinha está com ele, espere. Ele não pode fazer de novo!

     Policial, me ajuda! Olha, aquele homem está levando a menina!!!

     Não, não sei o nome dele. Juro que não...

     O policial o aborda. A garotinha corre para perto da mãe. Eu me aproximo. Ele me olha, mas não me enxerga, não me reconhece. Sou também uma mulher sem nome.

     Não entendo por que isso me dói tanto. Por que sinto essa ânsia no meu peito. 

     Desde pequena, sempre tive dificuldades para nomear coisas. Mas agora eu sei. Agora vou dar um nome para ele.

     Sequestrador.

     Dor.

     Amor.









Convidada especial ♥






















a Rafflecopter giveaway




















18 comentários

  1. Nossa Renata, que forte!
    Comecei lendo e quando vi a frase "termino de ler a última página de Orgulho e Preconceito de Jane Austen, talvez pela sexta ou sétima vez", pensei que ia ser um conto feliz.
    Me tocou muito seu texto, obrigada por compartilhar!
    Nem sempre é fácil escrever sobre temas como esse.
    Bjos

    ResponderExcluir
  2. Oi, Renata!!
    Adorei o conto!! Fiquei bem extasiada quando terminei de ler!! Parabéns!!
    Beijoss

    ResponderExcluir
  3. A dor, o medo, a solidão...tudo estampado nas letras expostas acima. Caramba...eu não imaginava pelo início do conto que seria tão forte assim. Dá pra sentir o desespero e me lembrou tanto O Quarto de Jack!!
    Parabéns!!
    Beijo

    ResponderExcluir
  4. também achei que seria um conto feliz, mas assim como na vida as surpresas também não faltaram a esse conto, sentimentos saltaram
    http://felicidadeemlivros.blogspot.com.br/

    ResponderExcluir
  5. Renata!
    Bem escrito e descrito, tanto o sentimento de amor, quando a dor em ver aquele que a desvituou, estar fazendo novamente e nem notá-la.
    Parabéns!
    “Conhecer os outros é sabedoria. Conhecer-se a si próprio é sabedoria superior.” (Lao-Tsé)
    Cheirinhos
    Rudy
    TOP COMENTARISTA DE MAIO 3 livros, 3 ganhadores, participem.
    http://rudynalva-alegriadevivereamaroquebom.blogspot.com.br/

    ResponderExcluir
  6. Que lindo Renata!!!
    O amor é bem isso msm, um sequestrador de todo nosso sentimento...
    Amei!!
    Bjs!

    ResponderExcluir
  7. Nossa... que forte!! Dá pra sentir toda a angústia, dor e confusão da personagem. Parabéns à escritora, eu adorei!!

    ResponderExcluir
  8. "Desde pequena, sempre tive dificuldades para nomear coisas. Mas agora eu sei. Agora vou dar um nome para ele.

    Sequestrador.

    Dor.

    Amor."

    Que história forte é essa ? Me tocou mesmo. Adorei as citações ao nome lindo e maravilhoso de Jane Austen... perfeito.

    ResponderExcluir
  9. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir
  10. Um conto forte que mexe com a gente e faz a gente lembra do passado, pois quem já passou por isso fica na memória é inesquecível não esquece um segundo, achei essa autora maravilhosa e sua resenha também.

    ResponderExcluir

Deixe seu comentário!

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...
Topo